Planejamento, orientação, correção e avaliação são quatro momentos imprescindíveis para fazer da tarefa uma aliada da aprendizagem
1 Lição eficiente requer planejamento"Ao planejar as aulas, também penso nas possibilidades de dever de casa que estão articuladas ao conteúdo trabalhado em classe." Simone Corrêa Santos Medeiros, professora da EMEF Aníbal Freire, no Rio de Janeiro, RJ
Ao realizar o planejamento das aulas, você deve pensar em quais atividades relacionadas ao conteúdo a ser trabalhado podem ser realizadas em casa pelos estudantes de forma autônoma. Além disso, é necessário refletir, buscando antecipar possíveis dúvidas dos estudantes e os procedimentos utilizados por eles. Dessa forma, a correção e a discussão da atividade em sala de aula tornam-se mais produtivas para todos.
"A complexidade das tarefas e o tempo necessário à sua realização têm de estar de acordo com a idade, com os conhecimentos construídos e também com o grau de autonomia que as crianças e os jovens possuem", defende a professora Maria Eulina. Se você pede como tarefa a leitura de um texto que foi entregue em sala, a garotada não requer ajuda para cumprir o combinado. No entanto, uma pesquisa sobre um tema específico, sem indicação de materiais de consulta e de explicações sobre os procedimentos a adotar para realizá-la, provavelmente vai demandar o socorro dos pais - o que não é recomendável.
Conhecendo bem as condições de vida das crianças e dos jovens, você consegue avaliar se uma atividade é viável. Eles possuem em casa um espaço propício aos estudos, com uma mesa, boa iluminação e sem interferência da TV, por exemplo? Precisam comprar algum tipo de material? Quanto isso vai impactar no orçamento familiar? Como é a rotina deles fora da escola? Se a ideia for um trabalho em grupo, esta é uma providência essencial: investigar se os estudantes moram próximos uns dos outros e podem ir sozinhos para a casa de algum deles ou se precisam dos pais para isso.
Saber se eles têm livros e acesso à internet é outra tarefa sua. Antes de propor uma pesquisa, visite a biblioteca da escola e do bairro para avaliar o acervo disponível e leve isso em consideração na hora de indicar a bibliografia. Se os alunos não têm computador ou acesso à internet em casa, os telecentros e o laboratório de informática da escola são ótimas alternativas. A escola deve ser sempre um local de estudos quando a criança não tem as condições necessárias em casa. "Organizar plantões de educadores para atender os alunos é uma ótima estratégia", defende Tânia. Para ela, em algumas situações, a escola de tempo integral tem se mostrado uma necessidade para assegurar um tempo maior de atividades na própria escola.
2 Boa orientação garante resultados
"Sempre aponto diferentes caminhos para a solução de uma tarefa. Isso dá mais confiança à turma." José Oliva de Santana, professor da EMEF Dr. Miguel Vieira Ferreira, em São Paulo, SP
Compreender por que a proposta é importante, de que forma está articulada ao conteúdo visto em classe e como será retomada por você na aula seguinte também contribui para que a turma veja sentido nela. "Outro ponto essencial é saber que não é preciso acertar tudo, mas sempre tentar, colocando em jogo tudo o que aprendeu", enfatiza Christina D’Albertas, professora do Colégio Vera Cruz, em São Paulo.
De acordo com o pedagogo francês Philippe Meirieu, no livroOs Trabalhos de Casa, não basta pedir que os alunos estudem determinado tema, por exemplo. É necessário indicar meios que permitam a eles verificar se estão no caminho certo - o que depende do tipo da atividade, do conteúdo e da disciplina trabalhados. Atividades como resumir, tomar notas e selecionar e sintetizar informações devem ser realizadas em sala antes de ser incorporadas às atividades pedidas para a casa. Com a revisão, ocorre o mesmo. Para Meirieu, "rever é reconstruir e não simplesmente uma tentativa de recordar conhecimentos anteriormente adquiridos". Segundo ele, uma revisão eficaz é aquela que possibilita reformular e trabalhar de outras formas aquilo que já foi visto.
Não existe um tempo predeterminado para a orientação dos alunos antes de cada lição, mas ele deve ser suficiente para que ninguém saia da escola com dúvidas. "No início do ano, no fim da aula, repasso as informações várias vezes até ter certeza de que todos entenderam. Quando nos aproximamos do último bimestre, o tempo da explicação já é bem menor", exemplifica Christina.
Dosar o volume de atividades para a casa é outra dificuldade, principalmente para os especialistas, nas séries finais. Para contornar a situação e não sobrecarregar a turma com lições das diversas disciplinas para o mesmo dia, uma saída é a articulação entre os docentes e a coordenação. Por meio de um calendário fixado em cada sala, os professores indicam a tarefa e a data de entrega. Com os alunos maiores, outro caminho é negociar prazos e quantidade com eles próprios, que podem dizer o que já foi passado por outros professores.
3 Correção é hora de tirar dúvidas
"Na correção, avalio o que cada um aprendeu. Todos sabem que não é só para ver quem errou ou acertou." Diogo Faria, professor do Centro Pedagógico da UFMG, em Belo Horizonte, MG
Maria Eulina lembra que nem sempre a correção individual é o ideal. Além disso, são poucos os professores que conseguem corrigir os deveres de casa de todos, devido ao grande número de escolas em que trabalham e de turmas para as quais lecionam. Porém essa situação, explica a especialista, não pode ser um empecilho para passar atividades para casa e, é claro, retomá-las em sala de aula. Há várias estratégias de correção.
Colocar as respostas no quadro para que as crianças simplesmente acompanhem e verifiquem se acertaram ou erraram, apesar de comum, não é a melhor opção. A sala precisa ter um papel ativo na correção. "Se um aluno leva para casa um desafio matemático, em classe ele pode socializar a forma como o resolveu e conhecer as soluções encontradas pelos colegas. Isso sem que seja preciso apontar uma estratégia única e correta", exemplifica Sandra Cristina Dedeschi, especialista em relações interpessoais na escola e mestranda em Psicologia Educacional pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Outras alternativas: discussão coletiva com autocorreção, em que o professor fala com toda a turma sobre a tarefa, levanta dúvidas, aponta caminhos e cada um confere no quadro se acertou; em duplas ou em grupo, em que cada um avalia a atividade do colega, sempre com a supervisão e intervenção do docente.
Se a classe é grande e você quiser fazer a avaliação individual, uma alternativa é olhar os cadernos de um grupo a cada semana. Dessa forma, também é possível priorizar os que apresentam maiores dificuldades de aprendizagem. Mas isso não dispensa a correção coletiva.
"Nesse momento, os alunos podem refletir sobre os conteúdos que aprenderam, levantar dúvidas e identificar o caminho que percorreram para chegar a determinada conclusão. Assim, podem enxergar onde está o problema e elaborar novas hipóteses", diz Regina Lico Suzuki, diretora de orientação técnica da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. Para você, esse é o momento de avaliar como a atividade foi feita, verificar quais foram as dúvidas mais comuns e analisar se a proposta estava clara.
Vale também investigar por que um ou outro não fez a atividade. Antes de levar o problema aos pais, a falta do dever tem de ser investigada e discutida com o próprio aluno, que, assim, passa a se sentir mais responsável. "Professor e aluno devem conversar sobre o assunto, pensar nas providências necessárias para que isso não ocorra novamente e combinar um prazo para a lição atrasada", defende Sandra. Nesse caso, será necessário um atendimento individual, já que a atividade já foi corrigida pelo restante da turma. Segundo a especialista, somente se o problema persistir e o aluno continuar não realizando as tarefas os pais devem ser envolvidos.
4 Avaliação permite definir rumos
"Com a avaliação da tarefa, consigo verificar não só se os alunos aprenderam mas também se meu trabalho está no caminho certo e se preciso retomar algum ponto." Jamille Almeida, professora do Colégio Miró, em Salvador, BA
Se muitos alunos não fizeram a tarefa, é preciso investigar onde está o problema. A dificuldade pode sinalizar que a maioria não entendeu o propósito dela e a forma de concluí-la e, portanto, a orientação dada na aula anterior não foi satisfatória. Outras vezes, o problema pode estar na própria tarefa, inadequada à realidade do aluno - por exemplo, quando pede a leitura de uma publicação que não está disponível na biblioteca da escola ou na internet e há a necessidade de comprar o exemplar.
Já se as condições estavam garantidas, o enunciado perfeitamente compreendido e, mesmo assim, a turma errou muito, não é o fim do mundo. Essa informação é valiosa e indica o que precisa ser ensinado novamente e quais conteúdos você terá de retomar. Isso, é claro, sempre com novas abordagens. "Qualquer obstáculo identificado na tarefa deve ser problematizado coletivamente em sala de aula. Isso é essencial para que a garotada realmente aprenda os conteúdos do currículo", explica Christina D'Albertas.
Vale ficar atento também à possibilidade de o dever de casa sempre estar correto, mas em sala os alunos apresentarem dificuldades. Isso pode ser o indício de que eles tiveram ajuda dos pais ou de outras pessoas na realização da tarefa, (por exemplo, quando uma criança em processo de alfabetização escreve em sala palavras com erros de ortografia - o que é esperado - e traz de casa textos sempre corretos). Nesse caso, vale perguntar para a criança se alguém a ajudou a corrigir e, se a resposta for afirmativa, conversar com os pais para que não intervenham e não peçam que ela apague e copie da forma certa. Se isso ocorre, perde-se uma boa oportunidade de trabalhar os erros recorrentes em novas atividades que podem beneficiar toda a turma.
"São poucos os educadores que usam a lição de casa para fazer a avaliação contínua da aprendizagem individual e de toda a turma", alerta Maria Eulina, com base em suas pesquisas sobre o tema. Para ela, o retorno dos alunos sobre como foi feita a atividade, as dificuldades encontradas no momento em que estavam sozinhos e se receberam ajuda são informações riquíssimas para o professor. "É preciso garantir na sala de aula um ambiente de respeito, abertura e acolhimento para que eles se sintam seguros em expressar as dúvidas que surgiram durante a realização dos deveres", defende Tânia. Dessa forma, não só os estudantes são avaliados mas você também pode ter importantes indicadores sobre a adequação de seu trabalho.
Conversar com os pais é condição para o sucesso da tarefa
As famílias precisam saber qual o papel delas: ajudar o filho a criar uma rotina de estudos e nunca realizar nada por ele
Ao mesmo tempo em que é um elo entre a escola e a família, a lição de casa também pode representar um ponto de conflito entre as duas instâncias. Os professores se queixam de que os alunos não fazem as tarefas e que seus pais não cobram isso deles. Outras vezes, que os pais fazem o trabalho no lugar das crianças. Do lado das famílias, as maiores reclamações são sobre atividades que a garotada não consegue realizar sozinha. Ao conversar com os responsáveis logo nas primeiras reuniões do ano, você evita alguns problemas. Veja a seguir.
O que evitar Que os pais interfiram na lição, façam correções ou as próprias atividades pelos filhos.
O que fazer Dar orientação sobre o papel deles nesse assunto: reservar um local e um horário para o estudo (prevendo momentos de lazer e descanso), assim como cobrar, motivar e incentivar a sua realização. Explique que um dos objetivos da atividade é promover a autonomia do aluno e que, portanto, é ele quem tem de fazê-la.
O que evitar Culpar as famílias de omissão no acompanhamento da vida escolar dos filhos sem saber em que situação vivem.
O que fazer Investigar quais são as condições de vida e o nível sociocultural das famílias para avaliar o tipo de acompanhamento escolar que elas podem proporcionar aos filhos.
O que evitar Culpar o aluno por não ter feito uma tarefa que exija a consultaa livros e a internet se ele não possui esses recursos em casa.
O que fazer Consultar as famílias a respeito da possibilidade de conseguir o material necessário ou acompanhar os filhos na visita a bibliotecas e telecentros quando a tarefa envolver pesquisas. Levar em conta que nem sempre há pessoas em casa com disponibilidade de tempo para isso.
O que evitar Reclamar com a família a cada vez em que uma lição não é entregue.
O que fazer Dizer aos pais que, se não consegue fazer o trabalho, a criança deve informar isso a você, na aula seguinte, e que a dificuldade não é motivo para castigos e punições - que não contribuem para a aprendizagem.
O que evitar Cobrar dos pais uma ação mais efetiva deles para que a criança aprenda.
O que fazer Garantir que a aprendizagem dos alunos ocorra na escola, que é responsável por isso. Mesmo que os pais tenham conhecimento sobre o conteúdo da tarefa, provavelmente eles não possuem conhecimento pedagógico. A tarefa de ensinar é sua, professor.
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